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sábado, 6 de abril de 2013

Minhas impressões de "Análise da Inteligência de Cristo" - Augusto Cury


Acabei de ler o primeiro livro da “Análise da Inteligência de Cristo” de Augusto Cury e gostei. Discordo em alguns trechos da forma como ele encara Jesus, mas achei produtivo no sentido de que traz argumentos bons pra respaldar a real existência de Jesus (não como filho de Deus, mas como personagem histórico).
Acho que todo agnóstico já se perguntou sobre a real existência de Jesus ou  se tudo não passa de um personagem de ficção. Augusto Cury aponta características da personalidade de Jesus que não poderiam ser criadas em um personagem fictício, pela pobreza intelectual dos escritores da época. Isso é um bom argumento.
Ele começa o livro dizendo:
“Investigar com critério aquilo que se vê e ouve é respeitar a si mesmo e a sua própria inteligência. Se alguém não respeita a sua própria inteligência não pode respeitar aquilo em que acredita. Não deveríamos aceitar nada sem antes realizar uma análise crítica dos fenômenos que observamos.”
Certíssimo! Não é porque se estabeleceu que algo é a verdade absoluta que isso não deva ser analisado intelectualmente.
Diz ainda: “A maioria dos ateus fundamentou seu ateísmo não em um corpo de idéias profundo sobre a existência ou não de Deus. Seu ateísmo era resultado da indignação contra as injustiças, incoerências e discriminações sociopolíticas cometidas pela religiosidade reinante em determinada época... A maioria dos ateus possuía e possui um ateísmo social, um “sócio-ateísmo”, alicerçado na anti-religiosidade, e não numa produção de conhecimento inteligente, descontaminada de distorções intelectuais, de paixões ateístas e tendencialismos psicossociais sobre a existência ou não de Deus.
Concordo. A maioria dos ateus se convenceu da inexistência de Deus em razão das atrocidades religiosas passadas e presentes. Mas, algo importante a se destacar é que ser contra religião não significa ser ateu!
Um argumento bom do livro:
“Se Cristo fosse fruto da imaginação dos seus biógrafos, eles não apenas teriam riscado os dramáticos momentos de hesitação que tiveram, mas também teriam riscado dos seus escritos a dramática angústia  que o próprio Cristo passou na noite em que foi traído, no Getsêmani. A descrição da dor de Cristo é uma evidência de que ele não era uma criação literária. Não viveu um teatro; o que ele viveu foi relatado.
Eles também não teriam silenciado a Cristo quando ele estava diante do julgamento dos principais sacerdotes e políticos. Pelo contrário, teriam colocado respostas brilhantes em sua boca. Cristo falou palavras sábias e eloqüentes que deixavam até as pessoas mais rígidas pasmadas. Porém, quando Pilatos, intrigado, o interrogava, ele se calou. No momento em que Cristo mais precisava de argumentos, ele preferiu se calar. Com a sua inteligência, poderia se safar do julgamento.
A criatividade intelectual não consegue criar uma personalidade que possui uma inteligência requintada e, ao mesmo tempo, tão despojada e humilde.” (pelo menos não a daquele tempo)

Outro argumento bom sobre a real existência de Jesus:
“Durante alguns anos eu pensava que as pequenas diferenças existentes nas passagens comuns dos quatro evangelhos diminuíam a credibilidade deles. Com o decorrer da minha análise, compreendi que essas diferenças também eram importantes para atestar a existência de Cristo. Compreendi que as suas biografias não procuravam ser cópias umas das outras. Eram resultado da investigação de diferentes autores em diferentes épocas sobre alguém que possuía uma história real.
Os evangelhos são quatro biografias “incompletas” produzidas, em tempos diferentes, por pessoas que foram cativadas pela história de Cristo.”


“É difícil encontrar alguém capaz de nos surpreender com as características de sua personalidade, capaz de nos convidar a nos interiorizar e repensar nossa história. Alguém que diante dos seus focos de tensão, contrariedades e dores emocionais tenha atitudes sofisticadas e seja capaz de produzir pensamentos e emoções que fujam do padrão trivial. Alguém tão interessante que seja capaz de perturbar nossos conceitos e paradigmas existenciais.”(mais difícil ainda reproduzir um personagem assim, especialmente naquele época)

Então, após argumentar sobre a real existência de Jesus na historia, ele passa a apontar seus ensinamentos para, talvez (isso não fica claro), comprovar a sua existência divina. Aqui eu discordo dos propósitos, mas concordo com os ensinamentos.

Uma das lições de Jesus era contra a ansiedade:
“Governamos o mundo exterior, mas temos enorme dificuldade para gerenciar nosso mundo interno, o dos pensamentos e das emoções. Somos subjugados por necessidades que nunca foram prioritárias, subjugados pelas paranóias do mundo moderno: do consumismo, da estética, da segurança. Assim, a vida humana, que deveria ser um espetáculo de prazer, torna-se um espetáculo de terror, de medo, de ansiedade...Ao longo de quase duas décadas pesquisando o funcionamento da mente humana, compreendi que não há ser humano que não tenha problemas no gerenciamento dos seus pensamentos e emoções, principalmente diante dos focos de tensão... O maior desafio da educação não é conduzir o homem a executar tarefas e dominar o mundo que o cerca, mas conduzi-lo a liderar seus próprios pensamentos, seu mundo intelectual.
Cristo tanto prevenia a ansiedade como discursava sobre o prazer de viver. Dizia: “ Olhai os lírios dos campos”

O que mais me chama a atenção no livro é o conhecimento do autor (psiquiatra) sobre o pensamento humano. Ele diz que as pessoas se recordam mais dos fatos com cunho emocional do que de palavras. E Jesus tinha noção disso, pois procurou falar menos e fazer mais. (especialmente considerando que ninguém escrevia sua história enquanto ela acontecia, mas algum tempo depois, através de testemunhos e lembranças)
“O passado não é lembrado, mas reconstruído. As recordações são sempre reconstruções do passado, nunca plenamente fiéis, apresentando às vezes micro ou macrodiferenças. A memória não é um sistema de arquivo lógico, uma enciclopédia de informações, nem a inteligência humana funciona como uma retransmissora dessas informações. A memória funciona como um canteiro de dados para que o homem se torne um construtor de pensamentos. Cristo tinha consciência disso, pois usava a memória como trampolim para expandir a arte de pensar. Estava sempre estimulando os seus discípulos a se interiorizar e a se repensar. Registramos de maneira mais privilegiada as experiências que tiverem mais conteúdo emocional, seja ele prazeroso ou angustiante, por isso temos mais facilidade de recordar as experiências mais marcantes de nossas vidas, tanto as que nos causaram alegrias como aquelas que nos frustraram.”

O autor enfatiza outra lição de Jesus, contra o preconceito:
“Quem conhece minimamente a grandeza e a sofisticação do funcionamento da mente humana vacina-se contra a ditadura do preconceito. As biografias de Cristo evidenciam que ele era uma pessoa aberta e inclusiva. Não classificava as pessoas. Ninguém era indigno de se relacionar com ele, por pior que fosse seu passado...A mulher samaritana ficou extasiada com a gentileza e a proposta inusitada de Cristo. Isso era demais para uma pessoa tão discriminada socialmente. Talvez nunca alguém lhe tenha dado tanta atenção e se preocupado se ela era uma pessoa feliz ou não. Todos a julgavam pelo seu comportamento, mas ninguém provavelmente havia investigado o que se passava no seu íntimo. Por isso, de repente, ela largou o seu cantil de água, esqueceu-se de sua sede física, saiu da presença de Cristo e correu para a sua aldeia animada e alegre. Parecia que a solidão, a angústia e o isolamento que a encarceravam e geravam uma intensa sede psíquica foram rompidos. Ela contou a todos da sua pequena cidade o diálogo incomum que teve com Cristo.”
É lindo ver que Jesus considerava o ser humano, independente de preconceitos e naquele tempo isso foi mesmo um divisor de águas, pois a sociedade era altamente impregnada de preconceitos. Acontece que a lição de Jesus não sobrevive ao resto da bíblia... mesmo no novo testamento, quando as pessoas já tiveram acesso aos ensinamentos de Jesus, o preconceito contra homossexuais, por exemplo, continua vivo. E nas passagens da bíblia em que se lê sobre relações entre dois homens (naquela época ainda não existia o termo “homossexual”, portanto, se sua bíblia diz isso, é só mais uma tradução errada), nessas passagens, vê-se que não se tratam de dizeres de Jesus, mas de pessoas que se dedicaram a escrever sobre o que acham que foram seus ensinamentos... Daí o problema de se considerar a bíblia como uma unidade sagrada de pensamentos divinos.

Acho interessante notar que, as supostas FALAS de Jesus, reproduzidas em algumas partes da bíblia, não eram tão humildes quanto suas atitudes... quem de fato lê a bíblia percebe quão incompatíveis são algumas falas a Jesus atribuídas, com o seu comportamento relatado... exemplo: quando ele está numa festa de bodas com alguns discípulos e sua mãe,  ela avisa que o vinho acabou e ele responde rispidamente “Mulher, que tenho eu contigo? Ainda não é chegada a minha hora”... (João 2:4) então ela provavelmente humilhada pela resposta, diz “façam o que ele manda”... e também no episódio da conversa com a samaritana que foi tão emblemático porque representou uma quebra de preconceito COM O GESTO, enfiam uma FALA tipicamente preconceituosa na boca de Jesus “a salvação vem dos judeus”(João 4:22)... obviamente se Jesus tentava quebrar preconceitos com aquela atitude, não incluiria a sua regionalidade na fala, mas diria algo como “a salvação vem de Deus...” algo universal e não regional, afinal, suas atitudes mostravam justamente a intenção de eliminar rótulos como “judeu, samaritano”, etc  e foi exatamente o que colocaram na boca dele com essa fala, um rótulo obviamente proveniente de quem escreveu o texto e não do Jesus, cujo comportamento visava eliminar tais conceitos. (aqui o maior argumento para não acreditar na bíblia cegamente, mas praticar somente o que Jesus em sua sabedoria tentou ensinar – raciocinem irmãos!!!)
O triste é ver que a mesma rigidez intelectual que Jesus tentou combater naquela época, hoje se estabelece exatamente em cima da sua história. O que foi dito sobre ele e “por ele” é tido como regra absoluta, mesmo nas partes mais obviamente incondizentes com o personagem de Jesus e, portanto, provenientes da parte ficta (ou “recordada”, “memorizada” e, ainda, “distorcida” por quem escreveu a bíblia).
O autor sabiamente diz que “Em suas biografias há indícios claros que expressam que ele conhecia a facilidade com que distorcemos a interpretação. Por isso afirmava que a fidelidade do testemunho de alguém tinha que ser confirmada por duas pessoas”.  Provavelmente por isso, Jesus AGIU tanto, no lugar de falar...

O autor se pergunta: Se Cristo tivesse vivido nos dias de hoje, causaria turbulência social, chocaria a política e a ciência?
O autor imagina uma situação em que Jesus está em um congresso de psiquiatria e faz como fez numa reunião descrita na bíblia, levanta e diz “quem acredita em mim, viverá um prazer inesgotável”... acredito que a colocação de Jesus seria diferente nos dias de hoje, mas a interpretação é a mesma... ele de fato falava sobre problemas psíquicos como ansiedade e tentava amenizar o sofrimento das pessoas com conselhos do tipo “não se preocupe com o dia de amanhã” e dizer que quem acreditasse nele, seria feliz, é meramente dizer que, quem entendesse o que ele dizia, quem conseguisse se concentrar no agora e deixar o amanhã de lado, se livraria da ansiedade. Hoje temos muitas pessoas que falam sobre isso, (vide “O Poder do Agora” de Eckart Tolle), então provavelmente Jesus não precisaria bradar numa convenção de psiquiatria, bastaria escrever um livro de auto-ajuda... talvez fosse até melhor compreendido porque não correria o risco de colocarem palavras na sua boca como evidentemente foi feito na bíblia. Mas, concordo que seus conselhos continuam úteis até os dias de hoje!

Sobre a eternidade que Jesus pregava, o autor diz que “...o pensamento de Cristo referente ao fim da existência tinha uma ousadia e complexidade impressionante. Ele discursava sobre a imortalidade com uma segurança incrível. A maioria dos seres humanos nunca procurou compreender algumas implicações psicológicas e filosóficas da morte, mas sempre resistiu intensamente a ela.”
O autor insiste em dizer que Jesus chocaria até a medicina nos dias de hoje com seu discurso sobre a vida eterna... ou seja, sobre a existência de vida após a morte do corpo físico. Acontece que hoje, graças à ciência, temos muito mais conhecimento sobre isso. Há estudos sérios sobre a existência de vida após a morte, realizados por cientistas de verdade, inclusive com algumas teorias muito boas sobre como se daria a continuação da existência sem o corpo físico. Então, concordo que Jesus falava de algo grandioso para sua época (embora a ideia de vida após a morte seja muito anterior a ele), mas hoje em dia, felizmente, somos uma sociedade que pode ao menos arranhar esse conhecimento de forma científica e menos chocante. O que não retira a característica de ser Jesus um homem à frente de seu tempo.
Acho que o maior feito de Jesus foi quebrar os parâmetros de pensamentos pré estabelecidos na época. Falou sobre o amor, sobre a humildade, que estavam esquecidos na sociedade... Mas, a questão da vida após a morte não foi seu maior assunto. Porque religiões foram criadas em torno dele e porque esse assunto assola todo ser humano, talvez a questão da eternidade seja tão associada a Jesus... mas, desde muito antes dele as pessoas acreditavam na vida após a morte (egípcios eram mumificados em função disso), sem que ninguém conseguisse explicar como isso ocorria fisicamente (no sentido de ciência da física), como Jesus também não explicou... mas acreditou, assim como muitos antes dele. Assim, não acho que falar sobre a vida após a morte seja algo especial em relação a Jesus... Os faraós já previam de forma análoga as tais “ruas de ouro” para onde levariam seus pertences (só não tiveram a sensibilidade de Jesus de imaginar que na vida após a morte, os bens materiais seriam desnecessários)
O que eu quero dizer é que, diferente do que muitas religiões pregam, não foi Jesus que introduziu a questão da vida eterna na história do homem.

Cury ainda fala algo extremamente sábio (eu mesma já cheguei a acreditar que poderia haver uma sociedade sem religião, MAS, isso é intrinsecamente impossível ao ser humano)

“Um dos maiores erros intelectuais de Carl Marx é ter procurado criar uma sociedade pregando o ateísmo como massificação cultural. Marx encarou a religiosidade como um problema para o socialismo. Ele era um pensador inteligente, mas por conhecer pouco os bastidores da mente humana, foi ingênuo. Talvez nunca tenha refletido com mais profundidade sobre as conseqüências psicológicas e filosóficas do caos da morte. Se o tivesse feito, teria compreendido que o desejo de superação da finitude existencial é irrefreável. O desejo de continuar a sorrir, a pensar, a amar, a sonhar, a projetar, a criar, a ter uma identidade, a ter consciência de si e do mundo está além dos limites da ciência e de qualquer ideologia sociopolítica.
O homem possui uma necessidade intrínseca de procurar por Deus, de criar religiões e de produzir sistemas filosóficos metafísicos.
O desejo de transcender o fim da existência não pode ser contido. A melhor maneira de propagar uma religião é tentar destruí-la. A melhor maneira de incendiar o desejo do homem de procurar por Deus e transcender o caos da morte é tentar destruir esse desejo.”
Infelizmente, as pessoas confundem “acreditar na vida após a morte” com “ser religioso” ou “acreditar na bíblia”. Ninguém precisa ser religioso ou acreditar na bíblia para ser imortal, caso isso seja uma consequência inevitável após a morte do corpo físico.


O autor fala que “Ele não disse que se as pessoas obedecessem a regras de comportamentos ou doutrinas religiosas teriam a vida eterna. Não! Os textos são claros, ele concentrou nele mesmo o segredo da eternidade. Disse que se alguém cresse nele e o incorporasse interiormente, essa pessoa teria a vida eterna, a vida inesgotável e infinita. Quem produziu um discurso como esse na história?”
De fato, um discurso difícil de se criar em um personagem fictício para os autores da época. O que reforça o argumento de que Jesus realmente existiu.
 MAS, é importante diferenciar o que muitas interpretações religiosas fizeram com esse discurso ao longo dos anos. Acho que quando Jesus disse “crer em mim”, queria dizer “acreditar no que eu digo” e isso é simples, acreditar que é recompensador ser humilde, amoroso, evitar a ansiedade, etc e isso faz com que a pessoa tenha vida plena (eterna, inesgotável, infinita)... e não acreditar nele como sendo o filho de Deus, senão ficará fora da “eternidade”. Ele simplesmente queria que as pessoas entendessem que o que ele pregava faria bem para suas vidas. Jesus, talvez, foi mais ousado do que outros grandes pensadores de épocas diferentes, quando disse que ELE era a fonte da alegria,  ao invés de explicar que SUAS PALAVRAS eram a fonte da sabedoria... pois, todos os outros pensadores dão seus conselhos, mas não os interligam à sua própria figura e foi isso que Jesus fez. Talvez porque na época isso fosse necessário para que as pessoas compreendessem o que ele dizia. (ou então, devido a certa prepotência implícita, mas esse aspecto psicológico eu deixo de lado porque prefiro acreditar que suas ações não condizem com esse traço. Embora fique evidente na bíblia que Jesus tinha seus rompantes nada honoráveis, como quando se descontrolou com o comércio realizado na igreja que ele considerava imoral)

Infelizmente, o que aconteceu na história em relação a Jesus é que ele se tornou um ídolo e, como dizia Carl Sagan, nenhum homem deve idolatrar outro, porque isso limita nosso raciocínio.
O autor fala que Jesus foi especial (divino?) porque geralmente, o homem precisa primeiro ter condições de sobrevivência para depois desenvolver a inteligência, mas “Cristo brilhou na sua inteligência, embora desde a infância tivesse sido castigado pela miséria. Além disso, o que é mais interessante, ele conduziu as pessoas da sua época, tão castigadas pela miséria física e psicológica, a ter uma fome do saber que transcendia as necessidades básicas de sobrevivência.”
Na verdade eu acho que as pessoas mais simples tendem a se voltar mais para o interior que as pessoas com necessidades materiais mais supridas. Pela minha humilde experiência social, tenho percebido que, embora mais crédulas e, portanto manipuláveis, as pessoas mais simples (financeiramente falando) são aquelas que mais se preocupam com a espiritualidade e a interiorização. Provavelmente foi o que aconteceu com Jesus.
O que dá para perceber no autor é que ele não escreveu o livro como um ateu que diz ter sido, mas como uma pessoa tendente a acreditar na divinização de Jesus. Ele não analisou a história de Jesus como um ser humano complexo, mas como o apregoado “filho de Deus”.  Isso prejudica sua exposição de pensamento, como nesse trecho:  “Se olharmos para a miséria do povo Israel e para o jugo imposto pelo Império Romano, constataremos que Cristo não veio na melhor época para expor seu complexo e audacioso projeto para transformar o ser humano. Se tivesse vindo numa época onde havia menos miséria e o sistema de comunicação estivesse desenvolvido, seu trabalho seria facilitado. Porém, há muitos pontos em sua vida, como esse, que fogem aos nossos conceitos: nasceu numa manjedoura, gostava de não se ostentar, escolheu uma equipe de discípulos totalmente desqualificada...”
Na verdade, se o autor encarasse Jesus como um ser humano complexo que foi, conseguiria entender (não fugiria ao seu conceito, ou seja, não seria algo misterioso) que a época em que ele nasceu, foi somente a época em que ele poderia ter nascido (o fato é que se fosse realmente enviado para expor um plano tão complexo de renovação da forma de pensar humana, ele poderia ter nascido em qualquer época... por que não na Idade Média? Ou, ainda, antes disso, evitando que as pessoas antes dele adorassem aos “deuses errados” sem saber?... Tudo isso só mostra que ele era apenas um ser iluminado, mas não “enviado”... como tantos outros, em diferentes momentos históricos, afinal, é de se supor que se fosse parte de um plano divino, estaria realmente em outro lugar e em outro tempo)
Nesse trecho o autor vislumbra o real trunfo de Jesus na época: “Não há dúvida que diversas pessoas o seguiam para atender às suas necessidades básicas e contemplar os seus atos sobrenaturais. Cristo tinha consciência disso. Porém, muitas o seguiam porque foram despertadas por ele, descobriram o prazer de aprender. Platão falou do deleite do processo de aprendizado. Se ele estivesse vivo na época de Cristo, provavelmente seria íntimo dele, ficaria encantado com a habilidade do mestre de Nazaré em conduzir as pessoas desprovidas de qualquer cultura a romper com a mesmice da rotina existencial e ter sede de se interiorizar.”
“Escolheu um grupo de homens iletrados e sem grandes virtudes intelectuais para transformá-los em engenheiros da inteligência e torná-los propagadores (apóstolos) de um plano que abalaria o mundo, atravessaria os séculos e conquistaria centenas de milhões de pessoas de todos os níveis culturais, sociais e econômicos...”
A meu ver, Jesus escolheu as pessoas erradas, mas estava entre a cruz e a espada – sem trocadilhos! Hahahah – porque se escolhesse incultos para propagarem suas ideias, como de fato fez, corria o risco de ver suas palavras distorcidas, como de fato acredito que aconteceu e se escolhesse os cultos escribas, correria o risco de não ser aceito como mestre, pois os cultos da época achavam que já sabiam tudo... um plano divino um tanto falho ou apenas um homem à frente de seu tempo, tentando fazer o que era possível na época?
O autor e todos os religiosos dizem que Jesus exaltava sua condição humana porque foi mandado à Terra justamente para provar o que seria essa condição e entender melhor o ser humano. Eu já interpreto da seguinte forma: as palavras de Jesus sobre ser “filho de Deus” foram interpretadas de forma a divinizá-lo, enquanto o que ele queria era apenas dizer às pessoas que existia algo grandioso além da vida, uma existência extra-física de onde todos viemos, mas quando percebeu que não estavam entendendo dessa forma, começou a destacar que era “filho do homem”, ser humano como qualquer outro, apenas com uma percepção diferente da existência.
Enfim, sobre esse livro é o que eu tinha a dizer... gostei do esforço intelectual do autor em argumentar pela existência de Jesus, o que me convenceu. Mas, ficou evidente que ele também acredita na sua divinização, embora não consiga argumentar suficientemente a favor, MAS, vale o livro e vale lembrar das coisas boas que esse grande pensador disse!