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quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

SOBRE OS JOVENS INFRATORES E SEUS POUCOS SONHOS


Em tempos de revolta popular contra o sistema penal que não penaliza o jovem infrator,  em tempos que a sociedade brada pelo tratamento de jovens como adultos e anseia por trancafiá-los em prisões que são escola do crime, vejo uma palestra de pessoas que tentam honestamente melhorar as condições do jovem infrator, através de parcerias com a sociedade civil, oferecendo oportunidade de estudos, emprego e um plano de vida fora do crime.

Hoje participei de uma palestra organizada pelo Tribunal de Justiça sobre o PIA (plano individual de atendimento) criado pela lei 12.594/12. Esse atendimento individual é destinado aos menores infratores quando encaminhados para cumprimento de medida sócio-educativa.

Tenho a nítida impressão que tal plano já deveria ter sido criado juntamente com o ECA há quase 25 anos, mas antes tarde do que nunca. A verdade é que o PIA veio complementar o ECA na medida em que tenta individualizar as internações (principalmente) de adolescentes e tenta de fato ressocializá-los, ao invés de só penalizá-los pelo ato infracional.

Não sei se em razão da nobre influência que sofri do promotor com quem iniciei minha vida profissional e que atua na área da infância e juventude, mas ainda hoje tenho essa esperança de que o jovem infrator pode ser educado e retirado da vida do crime.

A palestra contou com profissionais de várias áreas (promotoria, defensoria, magistratura, secretaria da Fundação Casa...) e foi uníssona ao mostrar o despreparo do Estado no cumprimento da lei. A cidade de SP tem aproximadamente 6 mil menores de 18 anos infratores, sendo que quase 3 mil (metade) vem de uma zona específica da cidade de SP. Em estudo de campo, foi constatado que essa zona não oferece sequer quadra esportiva em condições de uso para que esses jovens tenham lazer. Hoje o lazer da periferia é participar de “rolezinhos” e comprar artigos de “marca”, pois não são ensinados a valorizar o “ser” ao invés do “ter”. O Estado não oferece o mínimo de lazer e cultura para que esses jovens não se ocupem com coisas erradas.

A maioria dos jovens infratores, em sua primeira entrevista, afirma que sua vida não vai durar mais que 3 anos e que fatalmente terminará em algum dos 3 “c”: cadeia, cadeira de rodas ou cemitério. Com essa perspectiva, eles não têm motivos para deixar a vida do crime, pois querem aproveitar ao máximo o pouco que lhes resta, ainda que seja tirando dos outros.

O PIA tem a intenção de criar uma expectativa de futuro nesses jovens, mostrar possibilidades de vida e germinar sonhos que os façam crer em uma vida melhor e possível. Sem expectativa de futuro, não há razão para esforços. A profundidade desse plano está justamente em implantar nos jovens aquilo que o Estado não conseguiu nas escolas e os pais não conseguiram em casa: uma meta de futuro. Uma sociedade falida que não presta educação de qualidade e uma família desestruturada há gerações, que não consegue transmitir ideais aos filhos, precisa ser resgatada na última instância da vida, ou seja, na medida sócio-educativa, quando o jovem já entrou no crime e agora tem como última esperança a atuação das equipes multidisciplinares do PIA para torná-lo humanizado novamente.

O depoimento do coordenador da Fundação Casa traz esperança de ressocialização quando informa que mais de 800 jovens infratores passaram no último ENEM e 40 no ProUni (para educação superior). Mas, somente a educação obrigatória não conscientiza. O PIA tem uma missão muito maior, de criar sonhos nesses jovens e a crença de que é possível uma vida melhor.

O coordenador diz que muitos jovens chegam à Instituição para cumprir medida de internação e relatam querer apenas sorrir, pois os dentes estragados não deixam. Lá, passam por cuidados com dentista e saem com os dentes bonitos e um pingo de esperança nos olhos.

A situação degradante da nossa sociedade, em razão do desleixo estatal com a saúde, a educação e a cultura, se reflete nitidamente nesses jovens sem sonhos, com desejos consumistas irreais e sem afeto ao próximo. No final da linha, existem pessoas engajadas em melhorar o que poderia ter sido evitado muito antes.

Antes tarde do que nunca.

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